sábado, 8 de junho de 2013

A ilha





Foi no trigésimo terceiro mês do reinado de Alguém, no ano de Nosso Senhor que não quero lembrar agora, que os homens se rebelaram. Armados dos mais contundentes argumentos, eles resolveram marchar rumo ao céu, dispostos a dar um fim àquela situação.

Chegaram. São Pedro:

-  O que querem irmãos?

A porta voz:

-  Senhor São Pedro, viemos por essa comitiva pleitear uma audiência com Deus.

-  Como isso? Estão pensando que é assim é? Ele está em horário de almoço, e a não ser que seja um assunto de suma importância, não estou autorizado a liberar-lhes a passagem. Sobre o que se trata a audiência?

- Viemos reclamar contra as mulheres!

O santo puxou um ramal direto, pensou duas palavras e depois disse:

-  Entrem irmãos! Final do corredor, segunda porta à esquerda.

A comitiva rapidamente chegou ao escritório. Ele mesmo, de bermuda e chinelo, foi quem lhes abriu a porta.
-  Entrem, entrem. Almoço? Tem para todos aqui.

Sobre a mesa divinal havia uma taça de vinho e um pão simples; Os visitantes se acomodaram e recusaram o convite e o café, e finalmente disseram:

-    Senhor, viemos reclamar da sua invenção mais cruel, pérfida e desumana: A mulher!

-    Poxa, vocês não gostaram...?

- Não é questão disso, Senhor. Gostamos quando elas nos abraçam, gostamos de suas insinuações, e olhares e indiretas, e seus beijos, e seus cabelos roçando em nosso rosto, e de sua pele em nossa pele. A questão, ó Lorde do Universo, é que o Senhor inseriu um evento malévolo na já destrutiva
programação delas.

- Ah, é isso... Aquela parte do código...

- Exatamente, Pai. Por que diabos...

- Epa! Olha lá, hein! Bel estava no cafofo dele e não teve nada com isso!

- Cafofo que, por sinal, Deus, é vermelho também...

- Mas, poxa vida, vocês reclamam demais! Sabem quanto tempo levei para escrever aquela parte da programação?

- Provavelmente muito tempo, Senhor, posto que se não fosse esse detalhe, as mulheres não seriam tão complicadas como são hoje... e isso explica muita coisa...

- Mas foi tudo tão bem planejado...

- Senhor, não estamos dizendo que não foi, e sim que o funcionamento do homem não é compatível com essa... Peculiaridade feminina. É só chegar esse período que começam as tormentas! Tempestades, tsunamis, terremotos... Se as olharmos de  de uma forma "diferente", com a força de cem diabos
("Epa...!"), elas destroem a casa, espantam os animais, assustam as crianças e aterrorizam os maridos, namorados, o que for! Até as almas penadas fogem de uma mulher nesse período! E nos xingam, e esbravejam, e dizem que seríamos nada sem elas, e quando começamos a querer acreditar no que dizem, desabam a chorar, como se nós fôssemos os culpados pela hecatombe que causaram! E
quando vamos consolá-las, voltam com o demo ("Mas deixem o pobre Bel...") nos couros, nos chamam imaturos e idiotas, e botam-nos a dormir no sofá, e exaltam os cachorros a nós, isso quando os cachorros milagrosamente conseguem sobreviver ao ataque psicótico delas. Fora as agressões físicas... O Matias, onde está o Matias, ah, aqui está ele, o Matias, Senhor, teve aquilo amputado...

- Aquilo o quê...?!

- Não Senhor, acalme-se, ele teve só o dedinho da mão amputado porque havia se esquecido de cortar a unha por três anos...

- Pense pelo lado bom, já pode comandar a Capital...

- Qual Capital, Senhor? Ele mal manda na própria casa! E é por isso, Mestre, que viemos pedir então, a retirada justa e automática de todas as mulheres para uma ilha durante essa problemática fase.

- Precisam ser tão radicais assim? Isso é um absurdo!

- Nós já tentamos de tudo, Pai. Já nos escondemos em abrigos subterrâneos (elas nos acharam), já fugimos para as montanhas (foram destruídas), já nos trancamos no cafofo (elas nos expulsaram a todos, incluindo o Bel), já tentamos fugir de avião (disfarçaram-se de pilotos), já nos disfarçamos de
mulher (nos fizeram engolir as calcinhas uns dos outros), tentamos nos camuflar na floresta (quase fomos queimados junto com ela)... Acredite, só nos faltou testar isso. Por isso viemos pedir sua Divina ajuda.

- Mas que história é essa? Isso é loucura! Crie-os com suas chatices também.

- Mas nem por isso as expulsamos de casa ou as fazemos dormir no sofá! Pense bem, Pai: Quando chegamos daquela partida de futebol marota, todos suados e cansados, elas obrigam-nos a dormir no quintal de casa, e ainda por cima, nos obrigam a tomar banho! Será que elas não entendem que gostamos dessa exposição olfativa de testosterona pura? Então, se as incomodamos com nossas
chatices e somos isolados por elas, nada mais justo de que o contrário também ocorra... Senhor.

- Ai meu Jesus...

- Me chamou Pai? - um jovem careca entrou no gabinete divino.

- Não, filho, eu não o chamei, mas... O que diabos você fez no seu cabelo?

- Nossa Senhora, viu pai! O senhor também? Precisamos mudar esse conceito de “Jesus- branquelo – cabeludo - olho - azul – transforma -água-em-vinho”... Talvez tenhamos de voltar à Terra para dar umas aulas aos humanos...apesar de que mamãe disse que eles pintam meu olho claro para
combinar com o xale que deram à ela nas imagens...- e saiu.

- Ahn... Deus...? - timidamente inquiriu a porta voz.

- Ah, claro... Acho que o pedido de vocês, apesar de inusitado e absurdo, é válido, ao menos como uma experiência. Vocês serão atendidos. Mas lembrem-se: Tudo começará a partir do mês que vem, e não vou atender nenhum marmanjo que venha reclamar de saudade da esposa depois.

-    Obrigado, Senhor! Agora podemos desfrutar de um período de paz! Homens! – falou a porta voz – A guerra acabou!

E saíram cantarolando céu afora.

Nesse meio tempo, os homens mudaram. Não mais reclamaram pelas expulsões na base da vassourada, nem chamaram as mulheres de velhas caducas, tampouco ligaram de ter de dividir a casinha do cachorro. Muito pelo contrário, passaram a declamar a poesia existente no ato de se passar a noite fora
de casa, exposto às intempéries tendo apenas um cão como companhia; Exaltaram a coragem de suas esposas, ao desafiar uma força destrutiva como um tornado colocando-a fora de seus domínios; Entoaram cânticos de glória e alegria por tão maravilhosa recompensa terem recebido por ficarem bêbados; Abraçaram-se e cheiraram-se, compartilhando do odor viril e másculo que provinha de seus suores. Enfim, comungaram do prato da macheza e da testosterona.
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Foi no trigésimo quarto mês do reinado de Alguém, no ano de Nosso Senhor, de que não me recordo agora, que uma nova e potentíssima revolta surgiu.

Armado dos melhores e mais contundentes argumentos, o grupo dirigiu-se ao céu, disposto a dar fim àquela situação.

São Pedro, ao ver a ensandecida turba tremer o Paraíso, imediatamente abriu-lhe passagem.

-  Por aqui, por aqui...

-  Deus! – berrou a porta voz – Por que queres nos prejudicar? Que mal ou ofensa fizemos? Há dias que nossas ovelhas estão sem forragem, nossos cães ladram de tédio e nossas unhas estão a encravar! Onde diabos estão os nossos maridos?

-  Epa! Deixem o Bel fora disso! - uma mulher simples apareceu à porta –Além do mais, vocês não vão querer saber para onde eu os enviei.

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