quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Um


Do alto, a vila parecia minúscula, e o pássaro não perdeu muito tempo com ela.

A lama tinha uma estranha mistura de cinza em sua cor. Os porcos e outros animais chafurdavam na imundície da praça, no centro do aglomerado de ruas e casas.

Havia um casarão fortificado por ali em algum lugar, Mangot sabia, mas desde muito tempo que não era utilizado. Nem no Expurgo o edifício fora requisitado. Então não havia motivo para lembrar dele, concluiu.

Era uma atividade besta. Ir ao mercado, trocar algumas coisas, ficar de olho nos velhos ladrõezinhos. Os mercadores se aproveitavam de um descuido para mudar alguma coisa na troca, então tinha que ficar esperto com isso também; Espantar uma galinha ou porco do caminho, e no processo, repassar mentalmente toda a disposição do lugar, como se pesquisasse a melhor rota de fuga na hora de um aperto.

Mangot logo abandonou as imagens mentais das casas, em troca da lembrança daquele velho comerciante. Não conseguia recordar a quanto tempo ele estava permutando ali, mas não parecia ser há muitos dias. E mais do que isso, ele dera-lhe um embrulho estranho, e que não havia sido trocado. Recusou-se a dizer qualquer coisa, dobrou seus panos do chão e foi-se embora, apressado. como que temendo uma nova Queda.
 
O contemplado quase correu para casa. Por cima do saco de pano rústico, passou o dedo nos contornos do objeto, mas ficou sem ter certeza do que era.

A vila também quis abrir o pacote, ao fazê-lo tropeçar num caminho qualquer e derrubar o embrulho, manchando o pano de lama. Mangot rapidamente resgatou-o e continuou o trajeto, ansioso, como que a esperar algo, coração batendo forte e descompassadamente.

Assim que sentou-se no velho banco de madeira de sua choupana, seus dedos voaram para as tiras que fechavam com um nó o pacote misterioso, mas súbito medo o apanhou.

Teve apenas uma certeza, a de que ao abrir o saco manchado de lama, ele deixaria de ser quem era, pois seu caminho mudaria.

O nó foi desfeito de forma apressada, desajeitada.

E de lá de dentro, Mangot puxou um pergaminho.

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